Ufanismo da morte e a submissão dos demais

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Paulo Rosenbaum - médico e escritorJornal do Brasil

Revolução — do latim revolutio, o ato de revolver ou mudar um eixo ou um centro. Uma mudança total ou radical nas circunstâncias ou no modo de viver (Webster). 
Ao contrário das previsões dos experts em terrorismo internacional, os voluntários da Al Qaeda e milicianos congêneres avulsos crescem pelo mundo. Hoje, o cadastramento de homens-bomba é online e o kit suicida enviado por correio expresso. Pergunta-se se é possível que o manancial de psicopatas dispostos ao sacrifício da vida alheia seja mesmo assim tão inesgotável.
Com armas em punho, escondem-se com máscaras para desalojar e massacrar a população infiel. Infiéis, diga-se de passagem, são todos os desobedientes. Hoje em Falluja, Iraque, amanhã ninguém sabe. Explodem quem não aceita os critérios de retidão e virtude moral. Mas sua moral, o ufanismo da morte, é um verdadeiro ultraje aos princípios do próprio islamismo. Eles acreditam mesmo no que fazem, piamente. Isso talvez seja um pouco mais aterrador que os morteiros que  ostentam. Colocando de outro modo, quantos massacres com armas químicas ainda serão necessários na Síria? Dizem que os milicianos salafistas são um pouco piores que os capangas de Assad. Numa guerra civil, o tribalismo sectário é a fronteira do inferno.
Examinando de perto, é provável que se descubra os sujeitos mais dogmáticos que pisaram na Terra são os protagonistas das guerras santas. Mas ora, não são revolucionários? O perfil comum destes tipos é que, tal qual Lênin, não concebem revolução alguma sem um pelotão de fuzilamento. O que é uma revolução, então? Além da acepção clássica e de ter dado origem a um tipo de arma, conhecida como revólver, uma revolução é, antes de tudo, uma mudança promovida pelos homens. Não necessariamente para melhor.
Fascistas verdes, fascistas vermelhos e terroristas se assemelham na tática de submissão dos demais. Apesar da variedade dos cardápios justificacionistas, conversão é  conversão. Pode ser uma causa política, a adoração de um líder ou princípio religioso. Todo principista adepto da violência — é santa a própria guerra — terá na ponta da língua o álibi para tornar sua agressividade mais justa, sua opressão mais nobre, sua truculência inevitável.
Não basta contemplar. É vital estabelecer um diagnóstico para uma geração dessas. Máxima informação, mínima elaboração. Toda pedagogia deveria ter sido focada em dúvidas. Talvez tenhamos errado a mão na aplicação da psicologia da autoconfiança. O ensino da fé deveria ser sempre acompanhado de um manual de interrogações. Deveríamos decretar que toda teoria geral sobre qualquer coisa está, a priori, errada. Não é teoria, está no plano da observação empírica. Uma sociedade que insufla a convicção e a certeza parece ser bem pior do que aquela que estimula a dúvida e o questionamento.
É melancólico verificar o que as causas, motivações políticas e bandeiras estão sendo capazes de fazer com nosso resíduo de sanidade mental. E se os criminosos revolucionários das falanges que se encontram nas prisões nacionais derem mais um passo em direção à unificação? E se os insurgentes do mundo organizados começarem a se armar para fazer valer suas causas e demandas? O que fará a maioria que prefere não comungar, nem marchar ombro a ombro por causa nenhuma? As pessoas avessas à causa violenta permanecerão acuadas pelos gritões?
O que será que nos amedronta tanto que já não esteja em absoluta evidência para nos desgrudarmos das poltronas e alterar o estado das coisas? Ou os outros precisarão continuar se expressando para que continuemos calados? Percebemos então, de cabeça baixa e rendidos ao ceticismo, que, ao menos no plano  político, não há mais por quem torcer.  
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