COMANDANTE DA POLÍCIA MILITAR AFIRMA QUE OS CASOS DE VIOLÊNCIA EM COARI SÃO RESULTANTES DO ASPECTO CULTURAL E DA DESAGREGAÇÃO FAMILIAR

 Antes da entrevista: de farda da polícia militar, o Major Fabiano Bó está sentando ao lado do delegado da polícia civil e conversando com o presidente da Câmara Municipal de Coari. O major foi convidado à prestar esclarecimentos aos vereadores sobre o tema segurança pública, mas neste dia não houve reunião por não ter tido vereadores suficientes. 

Apenas 3 vereadores copareceram ao plenário da Câmara.

Em entrevista ao Blog Em Destaque, o comandante da Polícia Militar em Coari, Major Fabiano Bó fala sobre a onda de violência que o município está enfrentando. Fabiano Bó é graduado e pós graduado em segurança pública. Coari já é o terceiro município do interior do Estado em que ele atua no comando da polícia. Com 22 anos de carreira, o Major Fabiano Bó está em Coari desde dezembro de 2009. Esta entrevista também foi veiculada no programa Notícias em Destaque, que vai ao ar de segunda à sexta, na Rádio Nova Coari FM, as 7:00h.

MAJOR, QUAL TEM SIDO A POSTURA DA POLÍCIA MILITAR DIANTE DOS ÚLTIMOS FATOS VIOLENTOS QUE ESTÃO ACONTECENDO NO MUNICÍPIO DE COARI?

FABIANO BÓ – O dia de hoje é explicado pelo ontem, à história explica o dia de hoje. Hoje nós estamos vivendo uma herança. Eu recebi o comando em dezembro como uma herança maldita, do meu antecessor. Nós recebemos uma tropa desmotivada, um efetivo pequeno. É tão pequeno que, por exemplo, uma cidade como Tefé que tem uma população igual ou menor que Coari o efetivo policial lá é o triplo daqui, lá a corporação tem 120 homens enquanto em Coari nós temos 35 policiais. Recebemos viaturas capengas, todas baixadas, apenas uma viatura rodando (hoje já temos duas e estamos trabalhando para recuperar as outras), alguns policiais com desvio de conduta (nós tomamos providências com relação a isto e já os retiramos da cidade), então, hoje nós estamos trabalhando com uma herança maldita que nos foi passada.

Nós estamos com ações nos finais de semana, todas as festas onde há aglomerações de pessoas há a presença da policia militar.

Uma outra herança maldita que nós temos é que nos últimos 10 anos a cidade de Coari dobrou sua população: foi de 30 a 40 mil para 80 mil habitantes. Me diga qual foi a cidade no Brasil que em 10 anos dobrou a população? Só Coari. Então, hoje este 100% de aumento que Coari teve hoje estas pessoas estão aí, desempregadas na linha de pobreza, de miséria. E estas pessoas estão fazendo o que? Furtos, roubos e trafico de drogas. Até porque aqui o Rio Solimões é corredor natural do tráfico de drogas. Muitas pessoas que hoje vivem aqui vieram de outros estados e algumas destas pessoas lá já viviam no submundo do crime, como uma das pessoas que nós prendemos em dezembro que foi criado dentro de um morro do Rio de Janeiro, no subúrbio carioca. Está aqui em Coari: foi preso, mas já está solto. Então, estas pessoas vieram para cá e trouxeram todas estas mazelas destas cidades grandes e violentas para Coari. Estão aqui multiplicando seus conhecimentos, então Coari hoje é uma cidade do interior com todas as mazelas de uma cidade grande. Esta é a explicação histórica para entender o que estamos passando hoje. Uma cidade com 80 mil habitantes é para nós termos hoje pelo menos 80 policiais, e nós estamos trabalhando com 35, ou seja, estamos bastante defasados.

BLOG – QUAL TEM SIDO O SEU ESFORÇO NO SENTIDO DE PEDIR REFORÇO PARA COARI?

FABIANO BÓ – Já fizemos vários documentos com exposição de motivos, explicando toda esta questão histórica: o aumento da população, o aumento da pobreza, miséria e criminalidade e a diminuição de nosso efetivo. Uma tropa além de pequena, desmotivada e despreparada.

Hoje a situação é diferente. A nossa tropa está motivada, está com vontade de trabalhar e tem trabalhado corretamente. Sendo que as demandas são infinitamente maiores do que as nossas condições de trabalho. Nós estamos com as nossas duas viaturas rodando e os últimos crimes nós conseguimos elucidar. O caso do cartório...

Vamos pegar este caso da moça que morreu em uma overdose, em um “roque” e foi jogada em um ramal. Isto aí é um problema meramente familiar. Porque ela usava droga e a família não sabia. Quem jogou o corpo dela no ramal foi o primo que um mês antes nós o havíamos prendido com drogas e produtos de furto e já estava solto. “Tá” entendo? É um problema meramente familiar. Quer dizer, ela consumia droga, a família não sabia ou se sabia não fez nada, o primo a levou “para um roque”, matou, jogou ela no ramal, e aí? Onde é que está o problema de segurança pública. O problema não é de segurança pública. Até porque ela consumiu droga dentro da casa dele. Então o problema aí é de desagregação familiar.

O problema do cartório do mesmo jeito. A pessoa que deu inicio a tudo trabalhava dentro do cartório, diga-se de passagem; e o outro, primo dele que deu inicio ao roubo, também trabalhava na oficina do pai, ou seja, problema de desagregação familiar. Não é um problema de segurança pública. Entendeu? Então, as coisas estão acontecendo, as pessoas não podem achar que tudo é culpa da falta de segurança pública.

A culpa é sim dos pais que não educam, do pai que ver a filha ou filho chegar em casa com um tênis, com uma roupa ou um celular e não pergunta de onde veio. Porque se um adolescente chega em casa com um celular de 1.500 reais ou com um tênis de 400 e este pai não pergunta qual a origem, de onde veio, amanhã este filho está traficando, roubando, matando. E ele que jogar a culpa na conta da polícia? Negativo. Nós não podemos botar esta dívida na conta da polícia não. Botar sim na conta das famílias que estão desestruturadas, desagregadas, dos pais que não fiscalizam os filhos, que não orientam e não educam. Então, a maioria dos crimes não têm sido problema de segurança pública, tem sido sim, problema cultural e problema de desagregação familiar. 

A mãe de Treciane Souto. lamentou em um programa de rádio que o caso da morte de sua filha
tenha sido usado como exemplo de desagregação familiar e disse que sua filha foi assassinada.

BLOG – NÓS TEMOS OBSERVADO A FACILIDADE DO USO DE ARMAS DE FOGO EM COARI, INCLUSIVE A DUAS SEMANAS SEGUIDAS HÁ CASOS DE TIROS EM FRENTE A BOATE E TAMBÉM O RELATO DO ROUBO NA RESIDÊNCIA DA GONÇALVES LÊDO E SEGUNDO O DEPOIMENTO DAS VÍTIMAS, CADA UM ASSALTANTE PORTAVA UMA ARMA. DE QUE FORMA A POLÍCIA PODE TRABALHAR PARA TENTAR COIBIR ESTA FACILIDADE DO USO DE ARMA DE FOGO?

FABIANO BÓ – Nós já estamos trabalhando. Nunca a polícia militar apreendeu tanta arma de fogo como tem apreendido ultimamente aqui em Coari: temos uma média de uma arma por semana. Nós estamos aqui com uma grande quantidade de armas de fogo. É lógico, como eu lhe falei: as demandas são infinitas e os nossos recursos são escassos, mas nós já estamos trabalhando, a nossa produtividade ela está em alta, sendo que a criminalidade também. Como eu lhe falei, nós estamos estagnados porque diminui a nossa quantidade de viatura e efetivo de homens e a criminalidade dobrou, por todos aqueles motivos que eu já falei anteriormente.