Bombardeios russos provocam dúvida sobre desescalada do conflito na Ucrânia

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A Rússia afirmou nesta quarta-feira (30) que não vê nada de “promissor” nas negociações de paz com a Ucrânia, que a acusou de bombardear a cidade de Chernihiv e um centro da Cruz Vermelha em Mariupol.

“Os ocupantes bombardearam deliberadamente um prédio do CICV (Comitê Internacional da Cruz Vermelha) em Mariupol”, acusou Liudmila Denisova, chefe de direitos humanos do Parlamento ucraniano, sem apresentar relatórios sobre possíveis vítimas.

No norte, Chernihiv foi “bombardeada durante a noite”, disse o governador regional, Viacheslav Chaus.

Depois do porto estratégico de Mariupol (sul), Chernihiv, que tinha 280 mil habitantes antes da guerra, é a cidade mais atingida pelos bombardeios desde o início da invasão russa em 24 de fevereiro.

O porta-voz da presidência russa, Dmitri Peskov, jogou um balde de água fria nas expectativas criadas pelas negociações de terça-feira em Istambul.

“No momento, não podemos informar nada muito promissor ou um avanço. Há muito trabalho por fazer”, declarou Peskov.

O vice-ministro da Defesa russo, Alexander Fomin, no entanto, afirmou na terça-feira que, após essas negociações, a Rússia decidiu “reduzir radicalmente” sua atividade militar em torno de Kiev e Chernihiv.

Essas discrepâncias geram mais questionamentos sobre a relação entre o Kremlin e seu Ministério da Defesa.

Segundo relatórios de inteligência da Casa Branca, existe “tensão” entre o Estado-Maior e Putin, que “é enganado por seus assessores sobre o mal desempenho das forças armadas russas”.

– “Não acreditamos em ninguém” –

Na Ucrânia, as promessas foram recebidas com ceticismo.

“Não acreditamos em ninguém”, afirmou em um vídeo o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, lançando um alerta sobre a possibilidade das tropas russas estarem se reagrupando para iniciar um ataque contra a região de Donbass, mais ao leste.

Em seu vídeo, Zelensky insistiu na necessidade de tanques, aviões e sistemas de artilharia para conter a Rússia. “A liberdade deve estar tão armada quanto a tirania”, afirmou.

As potências ocidentais também estão cautelosas com a desescalada russa, embora um oficial de defesa dos EUA tenha apontado que as tropas de Moscou estavam se retirando da usina de Chernobyl, ao norte de Kiev, tomada no início da invasão.

O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, pediu que o ocidente “continue a intensificar as sanções” contra a Rússia até que o último dos soldados russos se retire da Ucrânia.

A Eslováquia anunciou a expulsão de 35 diplomatas russos, além das dezenas expulsas no dia anterior pela Bélgica, Holanda, Irlanda e República Tcheca.

– “Crimes de guerra” –

Durante a noite, foram escutadas diversas vezes as sirenes de alerta em Kiev e seus arredores.

“Nas últimas 24 horas, os russos bombardearam 30 vezes as áreas residenciais e as infraestruturas civis da região de Kiev”, anunciou o governador da região, Olaxander Pavliuk, que citou a zona norte da capital (Bucha, Irpin, Vyshgorod, Brovary) como a área mais afetada.

Mesmo assim, as forças locais parecem progredir lentamente, retomando cidades como Irpin, nos arredores de Kiev, Trostyanes (nordeste, 20.000 habitantes) ou uma importante rodovia estratégica no leste do país.

“Há cadáveres russos espalhados por toda parte”, disse um funcionário da inteligência ucraniana à AFP, afirmando que “os soldados russos estavam exaustos”.

A Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, assegurou que os bombardeios e ataques indiscriminados da Rússia contra áreas povoadas da Ucrânia geram “imensa preocupação” e podem constituir “crimes de guerra”.

Segundo o gabinete de Bachelet, desde o início da invasão e até terça-feira, 29 de março, 1.189 civis foram mortos, incluindo 98 crianças. Um balanço que, reconhece, está muito aquém da realidade, pois as suas equipas não têm acesso direto aos locais mais expostos, como Mariupol (sudeste), onde foi detectada a presença de valas comuns.

– Segurança alimentar mundial –

Em cinco semanas de guerra, quatro milhões de ucranianos tiveram que fugir de seu país, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur). A Europa não registrava um fluxo de tal intensidade desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). No total, mais de dez milhões de pessoas, ou seja, mais de um quarto da população, foram obrigadas a deixar suas casas.

O Programa Alimentar Mundial da ONU (PAM) anunciou que está fornecendo ajuda alimentar de emergência a um milhão de pessoas no país.

Mas as consequências vão além da Ucrânia. A guerra entre dois grandes exportadores de trigo coloca em risco a segurança alimentar mundial, alertou o diretor da FAO, Qu Dongyu, de Quito, pedindo a “proteção das pessoas contra a fome”.

– Cessar-fogo em Mariupol –

Em um dos epicentros desta crise humanitária, Mariupol, a Rússia anunciou um cessar-fogo a partir desta quinta-feira às 10h do horário local para evacuar civis deste porto sitiado no Mar de Azov.

O Ministério da Defesa indicou que permitirá a abertura de um corredor humanitário para a cidade de Zaporizhia e solicitou a participação da Acnur e do CICV nesta operação.

Cerca de 160.000 civis ainda estão presos na cidade assolada, sobrevivendo em abrigos sem eletricidade e sem comida e água, segundo depoimentos coletados pela AFP de pessoas que fugiram da cidade.

Autoridades locais denunciam deportações forçadas de seus cidadãos para a Rússia, entre eles cerca de 70 pessoas, incluindo mulheres e médicos de uma maternidade, de acordo com o gabinete do prefeito nesta quarta-feira.
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